A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, apresentou nesta quarta-feira (8) ao Supremo Tribunal Federal (STF) ação direta de inconstitucionalidade (ADI), com pedido de medida cautelar, contra duas emendas à Constituição de Goiás, que estabeleceram o regime de limitação dos gastos correntes dos Poderes estaduais e dos Tribunais de Contas, Defensoria Pública e Ministério Público naquele estado, até o ano de 2026. Atualmente o estado possui um déficit financeiro acumulado em torno de R$ 6 bilhões.
O documento se volta contra as emendas constitucionais goianas nº 54/2017 e 55/2017, que alteram a Constituição do Estado e o respectivo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Segundo Dodge, as modificações contrariam a competência da União para editar normas gerais de direito financeiro (artigo 24-I e §1.º, da Constituição Federal) e para definir os limites de despesas com pessoal (artigo 169-caput), além de desrespeitarem os comandos constitucionais de aplicação de recursos mínimos para o custeio dos serviços públicos de saúde (artigo 198-§2.º-II) e de educação (artigo 212).
De acordo com a PGR, as emendas estaduais não poderiam instituir regime fiscal mais brando do que o modelo definido na Constituição Federal, especialmente nos pontos que tratam de despesas e limites previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, sob pena de afronta ao modelo constitucional de repartição de competência legislativa, que confere à União a atribuição de dispor sobre normas gerais de direito financeiro.
Um dos pontos críticos é o artigo 45 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, da Constituição Estadual de Goiás, que suspende pelo prazo de 10 anos a exigência da aplicação mínima em saúde e educação vinculada à receita pública. Outro trecho polêmico se refere à introdução de um novo conceito de limite de despesa com pessoal, por meio da exclusão das despesas com pensionistas e valores referentes ao Imposto de Renda retido na fonte.
“Tal norma estadual apenas mascara os gastos com pessoal e a real situação financeira dos entes estatais, criando uma situação ilusória de atendimento dos limites impostos no artigo 20 da Lei de Responsabilidade Fiscal”, observa Raquel Dodge, acrescentando que devem ser computadas como despesas com pessoal os gastos com ativos, inativos e pensionistas.
Saúde e educação – A emenda constitucional goiana nº 54/2017 desatrelou os gastos com saúde e educação da receita efetiva arrecadada, abaixo do patamar fixado pela Constituição Federal, passando então a considerar os limites gerais do teto do valor despendido no exercício anterior. Na prática, a medida desobriga o administrador de aumentar investimentos nessas áreas em caso de incremento de receita, devendo apenas obedecer o novo teto, acarretando diminuição do controle daquilo que deveria ser efetivamente revertido em benefício desses setores. “Tal desafetação tributária configura clara afronta à Constituição, haja vista que a vinculação orçamentária consta expressamente do seu texto como forma de proteção e efetivação dos direitos sociais”,
Pedido cautelar – A adoção do regime fiscal de Goiás permitiu que fossem incorporadas novas despesas de pessoal no orçamento, situação que comprometeu não só a capacidade do estado de investir em infraestrutura, como inviabilizou inclusive o custeio da máquina. Ou seja, nem mesmo a totalidade das despesas correntes hoje pode ser coberta com a receita orçamentária. “O resultado desta medida fica evidente na situação em que atualmente se encontra o Estado com o déficit financeiro acumulado em torno de R$ 6 bilhões, perante uma Receita Líquida Corrente projetada para o ano de 2019 na casa de R$ 22,8 bilhões”, explicou a PGR ao justificar a necessidade da concessão da medida cautelar “a fim de obviar os prejuízos que advêm da aplicação atual das regras ali estabelecidas”.